Recuperação judicial não é bagunça”, diz advogada

 

A Vara Única da Comarca de Santa Rosa de Viterbo indeferiu o pedido de recuperação judicial movido por uma rede de supermercados, presente nos municípios de Santa Rosa de Viterbo, Tambaú, Santa Cruz das Palmeiras, São José do Rio Pardo e, mais recentemente, em Ribeirão Preto, após a verificação de indícios de fraude. Além disso, foi determinado que o caso seja encaminhado à autoridade policial para investigação de suposta infração penal por parte de sócios administradores da empresa e de um terceiro. Cabe recurso da decisão.
De acordo com a advogada Natália Marques, o juiz entendeu que a rede de supermercados alegou crise econômica, com passivos de mais de R$ 135 milhões, mas mostrou grande capacidade de investimento ao expandir os negócios para Ribeirão Preto, com custo estimado em R$ 61 milhões de reais.

– “A lógica da RJ é permitir a sobrevida de empresa que passa por um período de dificuldade financeira, mas que tem condições de se reerguer e continuar a gerar valor para a sociedade. Não é instituto para fugir de pagamento de dívidas ou obter forçadamente descontos por parte dos credores. No caso em pauta, foram levados em conta vários elementos que sugerem que a situação de crise econômica, que justifica um pedido de recuperação judicial, não corresponde à realidade da empresa. O primeiro deles é a loja recentemente inaugurada em bairro de alto padrão em Ribeirão Preto, sendo que quem passa por uma situação de crise a ponto de não conseguir pagar credores e pedir RJ obviamente não investe e aumenta ainda mais o passivo só para piorar ainda mais a situação do caixa Além disso, no curso do processo, além de inconsistências nos balanços patrimoniais, constatou-se que houve contratação de empresa terceira, recém-aberta em nome do ex-marido de uma das sócias e principal administradora da requerente, para transferência de faturamento e da titularidade dos valores recebidos em vendas realizadas com cartões bancários. Esse fato, somado ao anterior, sugere que as dívidas da empresa são concentradas em um CNPJ, e o faturamento é desviado para empresas terceiras que não foram incluídas no pedido de recuperação judicial”, explicou a advogada.
No entendimento do juiz, o conjunto dos fatos indica uso ilícito da recuperação judicial para obter a redução forçada de obrigações recém-contraídas, o que caracteriza crime previsto na Lei nº 11.101/05.
“O juiz entendeu que os integrantes da empresa requerente, de forma fraudulenta, realizaram uma operação pela qual uma empresa, que não entraria no processo de RJ, receberia todos os bônus da atividade empresarial, enquanto o CNPJ que requereu a recuperação judicial concentraria todas as dívidas. Ou seja, o entendimento foi no sentido de que a empresa criou, de forma artificial, uma situação de crise para justificar o pedido de RJ e obter benefícios legais de forma torpe, contrária ao objetivo da lei”, ressaltou a advogada.
Ela destaca que a legislação está mais atenta a situações em que o instituto da recuperação judicial é utilizado de forma fraudulenta. “Não é a primeira vez que um juiz nega o deferimento do pedido por suspeita de fraude. Cada vez mais há uma atenção para empresas que visam se valer de benefício legal de forma torpe. É por essa razão que hoje a lei prevê que, antes do deferimento do pedido, pode ser determinada a realização de uma perícia prévia na empresa e em seus documentos como uma forma de avaliar se realmente a “história” contada na petição inicial tem lastro. Isso é para evitar não só situações como a que vimos recentemente, mas também de empresas que não são mais operantes e visam obter uma sobrevida do CNPJ sem realmente gerar uma contrapartida à sociedade. Em suma, cada vez mais o Poder Judiciário manda recados no sentido de que a recuperação judicial não é bagunça”, destacou a advogada Natália Marques.

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